Abstract:
O presente estudo tem por objetivo compreender como a (in)visibilidade manifesta-se na
construção de memórias de catadores participantes de movimentos nacionais nos contextos
Brasil e França. No Brasil, mais de 800 mil catadores são responsáveis por 90% da reciclagem
dos resíduos sólidos pós-consumo. Na França, cerca de dois mil “biffins”, catadores que
restauram produtos usados, realizam venda em feiras conhecidas como “mercado de pulgas”.
Ambos encontram nos “restos da sociedade” uma oportunidade de trabalho e de sobrevivência.
Resistem perante as situações de opressão, exclusão, criminalização e desvalorização em busca
de visibilidade, reconhecimento econômico, ambiental e social. Desse modo, a problemática
central de investigação: como a (in)visibilidade manifesta-se na construção de memórias de
catadores participantes de movimentos nacionais nos contextos Brasil e França? A partir das
perspectivas apresentadas, estabeleceu-se como objetivo geral compreender como a
(in)visibilidade manifesta-se na construção de memórias de catadores participantes de
movimentos nacionais nos contextos Brasil e França. Como percurso metodológico, optou-se
pela abordagem qualitativa de cunho descritivo, onde (entre dezembro de 2016 e julho de 2018)
foram realizadas 17 entrevistas semiestruturadas (10 no Brasil e 6 na França), observação não
participante e documentos textuais, ressaltando-se a entrevista com o Professor Doutor Emílio
Eigenheer. Os dados foram analisados pelo Sonal 2.0.97, um software livre que armazena os
arquivos em texto e áudio, utilizado em pesquisas qualitativas, mas ainda pouco difundido no
Brasil. Os resultados apontam que a (in)visibilidade na construção de memórias, descende
principalmente do estigma construído na trajetória de trabalho dos catadores e dos biffins. A
memória da invisibilidade do trabalho dos catadores emerge relacionada à questão econômica
enquanto a memória da visibilidade do seu trabalho está vinculada a questões sociais e
ambientais. As análises evidenciaram ambiguidades na compreensão de tais memórias como: a
caracterização do resíduo versus lixo; a invisibilidade e a visibilidade perante as leis de
reconhecimento e inclusão na prestação de serviços da coleta seletiva; a discriminação e a
glamourização que sofrem os catadores; o estigma bom e o estigma mau, dados da reciclagem
no Brasil e dados dos trabalhadores na catação; importância de estudos em relação a memória
da limpeza urbana e memória subterrânea versus memória oficial. E mais, a partir das
ambiguidades, foi identificada a possibilidade da construção de pontes para a promoção da
visibilidade do trabalho dos catadores.